-O Estado consome em despesa pública perto de metade do PIB. Falar em corrupção, ignorando as relações contratuais com o Estado nos diferentes níveis da administração, ou esquecer derrapagens nas obras públicas é tentar tapar o sol com a peneira. Pensando com os meus botões, imaginemos que um construtor paga luvas a um autarca para obter o licenciamento num qualquer projecto, adjudicando depois a obra em subempreitadas a diversas pequenas e microempresas que o vão construir. O levantamento do sigilo bancário servirá apenas para confirmar que os empresários, na sua maioria também trabalhadores, estão a efectuar correctamente os descontos para a segurança social dos cabo-verdianos e moldavos que trazem a trabalhar, mas não terá qualquer utilidade para detectar os ganhos do construtor e do autarca, que facilmente colocam o dinheiro a salvo. Igual princípio será válido para apanhar pequenos comerciantes, trabalhadores independentes, que terão as suas contas devassadas no dia em que comprarem um BMW, mesmo que depois fiquem dez anos com ele, ou comprem a casa dos seus sonhos que irá durar o resto da vida. Já os autarcas e demais boys colocados na administração pública, estarão a salvo desta política persecutória, uma vez que os seus rendimentos não declarados serão de prova bem mais difícil, para além de contarem com um aliado de peso, a lentidão e ineficácia do sistema judicial, que como todos sabemos não consegue obter uma única condenação nos casos que envolvem pessoas mais importantes. Não se iludam com falso justicialismo, o que está verdadeiramente em causa com o levantamento do sigilo bancário não é o combate à corrupção, mas sim possibilitar ao Estado arrecadar mais receita fiscal, tributando aqueles que ainda vão conseguindo escapar ao monstro. Cá estaremos para ver, implementada a medida um qualquer futuro ministro das Finanças reclamando ter apanhado mais uns quantos milhares de pequenos criminosos, quando poderia ser bem mais eficaz com poucas centenas que continuarão a escapar incólumes.