-A questão da eutanásia nunca foi pacífica, misturando argumentos éticos, religiosos e alguns interesses. Por um lado a legalização de tal prática poderia levar à diminuição dos gastos do Estado com cuidados paliativos, pessoalmente preferia outro modelo de saúde, mas vou colocar a questão no âmbito da realidade existente em Portugal, por outro serviria para abrir portas sobre as quais tenho dúvidas, muitas dúvidas. Considera-se eutanásia a morte medicamente assistida a pedido do próprio ou seu familiar, vamos por partes, a pedido do próprio, se me perguntarem hoje, se pretenderei que algures no futuro me prolonguem a vida, em condições de sofrimento, respondo já que não, o futuro é sempre um lugar distante, mas quem garante que uma vez no leito de morte, não me agarrarei à vida? Em 2003 perdi um amigo, em agonia, com uma doença oncológica em fase terminal, a poucos dias da morte falava em melhorar ligeiramente, para tentar assistir ao concerto dos Stones em Coimbra. Homem sem qualquer fé religiosa, tenho a certeza que jamais solicitaria a eutanásia, mas, e se alguém o fizesse por ele? Também sabemos que a morte de alguém pode trazer benefícios a familiares, heranças por exemplo, será legítimo permitir que tal aconteça? Tenho menos dúvidas no caso mundialmente conhecido de Ramón Sampedro, que estaria na posse de todas as suas faculdades, se é que as psicológicas se pudessem considerar intactas, mas concedo o benefício da dúvida que o próprio teria condições mínimas de decisão. Mas quantos casos existem equiparados? Quer-me parecer que a legalização da eutanásia permitirá sobretudo aliviar o sofrimento de familiares, a questão que se coloca a meu ver é, e teremos nós tal direito enquanto sociedade? Quem deposita familiares nos Hospitais, e depois os abandona, certamente responderá que sim, mas a maioria pensará o mesmo? E se for consigo? Já pensou em tal hipótese?